A 4ª Câmara do TRT-15 condenou uma microempresa do ramo de comércio de equipamentos para escritório, a pagar à reclamante indenização por danos morais no valor de R$ 3 mil, por ter usado provas ilícitas no processo trabalhista em que a trabalhadora questionou essa e outras diversas irregularidades, como o fato de ter sido demitida por justa causa, por ter esquecido de lançar no livro caixa o recebimento de um valor.
O Juízo da 7ª Vara do Trabalho de Campinas havia julgado improcedente o pedido da trabalhadora com relação à ilicitude da prova, obtida por meio de instalação de programa espião na empresa, e que foi responsável por divulgação de mensagens pessoais, com exposição da trabalhadora. A reclamante insistiu na tese de que esse programa representa invasão de privacidade e enseja o pedido de rescisão indireta, até porque a empresa “permitia o uso das ferramentas denominadas FACEBOOK e MSM, além de ‘e-mail’ pessoal, por meio dos quais eram tratados assuntos particulares, não passíveis de visualização pela empregadora, sob pena de configuração de invasão de privacidade”.
A sentença havia destacado que não há que se falar em prova ilícita, tampouco em invasão de privacidade em razão do uso de programa “espião” pela reclamada, “uma vez que as conversas entre a reclamante e outra funcionária juntadas aos autos foram retiradas dos computadores da reclamada, sendo certo, ainda, que tais conversas ocorreram durante a jornada de trabalho”.
A relatora do acórdão, desembargadora Eleonora Bordini Coca, pensa diferente. Para ela, “o empregador extrapolou os limites do seu poder diretivo”, isso porque “o acesso às conversas veiculadas na ferramenta em comento representa violação ao direito da intimidade da trabalhadora, além de a prática demonstrar ofensa ao artigo 5º, inciso XII, da CF”. O acórdão ressaltou também que “a empregadora não impedia o uso da ferramenta no ambiente laboral e, por isso, não poderia acessá-lo por meio do denominado programa ‘espião'”.
A condenação da empresa aos danos morais, pelo colegiado, se deveu, principalmente, pelas “atitudes patronais irregulares”, como “a manutenção de filmes pornográficos em seus computadores, com a possibilidade de visualização por quaisquer empregados, causando-lhes constrangimento”, pela “publicidade das conversas pessoais da reclamante, obtidas por meios ilícitos” e pelo “tratamento desrespeitoso do representante da reclamada com relação à reclamante, com sua exposição perante outros funcionários”. Em todos esses casos, “o dano é presumível, visto que a obreira teve sua honra afetada com o comportamento desproporcional por parte do proprietário da ré”, concluiu o colegiado.
Quanto à rescisão por justa causa, mantida pelo Juízo de primeiro grau, a Câmara mais uma vez entendeu diferente. Segundo constou dos autos, a rescisão se deu em 18/8/2012, quando a trabalhadora “cessou a prestação de serviços e enviou comunicado de rescisão indireta ao empregador”. A dispensa por justa causa, porém, se concretizou nove dias depois, em 27/8/2012, devido à ausência de registro no livro-caixa de um valor recebido pela trabalhadora, apesar do “perdão tácito da empregadora” alegado pela reclamante.
Para o colegiado, os documentos juntados “não são suficientes para comprovar o comportamento funcional irregular da empregada”, até porque “são meramente unilaterais, supostamente extraídos dos sistemas da empregadora”. Além disso, “não houve produção de prova pericial, para aferir a validade dessas informações”, tampouco a “produção de prova testemunhal, com a oitiva da suposta consumidora lesada, por exemplo, a fim de demonstrar o comportamento irregular da obreira”, afirmou. O acórdão ressaltou ainda que esse “evento veio à tona somente com a apresentação de defesa pela ré”. Antes disso, “a reclamante já havia enviado notificação ao empregador informando que não mais compareceria ao trabalho e, somente após esse evento, a reclamada cogitou na aplicação de justa causa, sem, contudo, especificar os motivos da aplicação da penalidade disciplinar máxima – dispensa por justa causa”, afirmou.
A Câmara afastou a dispensa por justa causa considerando todos esses fatos e mais o comportamento do empregador, que se revelou “ilícito”, o que, para o colegiado, “chancela o acolhimento da pretensão do reconhecimento da rescisão indireta”. O acórdão lembrou que “não se pode olvidar que o empregador, por meio de seu sócio, anuiu com a manutenção de filmes pornográficos nos computadores da empresa”, o que representa “o não cumprimento das obrigações do contrato (artigo 483, alínea “d”, da CLT), afinal, não se manteve ambiente laboral idôneo, com inequívoca ciência do empregador”.
Além disso, “houve a instalação de programa ‘espião’ nos computadores, de forma sorrateira, com publicidade das conversas pessoais da reclamante, em completo desrespeito aos limites do poder empregatício”. Como se não bastasse, “a prova testemunhal demonstrou o tratamento desrespeitoso do representante da reclamada com relação à reclamante”. Por tudo isso, declarou a rescisão indireta do contrato de trabalho da reclamante e deferiu os créditos decorrentes e ainda condenou a empresa ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 3 mil.