As transformações tecnológicas que trouxeram automação e robotização para o ambiente de trabalho são motivo de preocupação para a magistratura brasileira. Nesta terça-feira (21), durante o painel 19 da XXII Conferência Nacional dos Advogados, no Rio de Janeiro, o conselheiro federal da OAB/RS e doutor em Direito do Trabalho pela USP, Raimar Machado, tratou do tema “Conceituação Ampliativa e Limites da Possibilidade Jurídica do Pedido na Ação Trabalhista”.
Machado disse que o ativismo judiciário deveria sempre partir das suas fundamentações de um certo padrão lógico. “A paz social depende de um sentimento concreto de justiça para cada caso. A estrutura lógica das decisões deverá guardar correspondências com outras decisões. A jurisdição deve estar baseada concretamente em um padrão lógico único. Os casos concretos são variáveis, mas os direitos não são variáveis, são os mesmos para todos”, afirmou.
Por sua vez, o ministro do Tribunal Superior do Trabalho, Alexandre Agra Belmonte, lembrou que o atual ambiente laboral no cenário nacional difere daquele que propiciou o surgimento das normas trabalhistas – mais fabril e agrário – e disse que o trabalho precisa ser protegido contra as transformações tecnológicas. “A redução de direitos é incabível. Normas constitucionais precisam ser regulamentadas para a proteção à automação”, defendeu.
O ministro ponderou que a lei ainda protege os trabalhadores, garantindo que suas funções profissionais não serão substituídas por máquinas em locais como postos de gasolina, indústrias e empresas de prestação de serviços como bancos, vendas diretas e transporte. Agra Belmonte participou do painel “CLT e valorização do trabalho”, que foi presidido pelo professor e conselheiro federal da OAB-MS, Alexandre Mantovani.
Outro ponto que inspira atenção foi ressaltado pela desembargadora do TRT-RJ, Sayonara Grillo. A terceirização do emprego no Brasil, cada vez mais frequente, pode dificultar a valorização do trabalho e impedir a efetivação dos direitos, segundo a desembargadora. “No Brasil a terceirização representa a precarização do mercado de trabalho e uma prática empresarial de transferir as incertezas do mercado de trabalho das empresas para o empregado”, argumentou.
Para Sayonara, a terceirização levou a uma concentração de empregos e a “altíssima” rotatividade no mercado nacional. Além disso, reflete um movimento de reprodução de desigualdades no mercado de trabalho. “A terceirização corrói o direito do trabalhador e esvazia as potencialidades das greves”. A desembargadora alertou também que essa forma de contratação vem crescendo cada vez mais em atividades ilícitas no país e disse que há um incremento desse tipo de contratação em redes produtivas.
Avanços nas garantias de domésticas
Um dos maiores avanços da sociedade brasileira foi a constitucionalização dos direitos trabalhistas, afirmou a ministra do Tribunal Superior do Trabalho, Delaíde Arantes. A magistrada lembrou que, em 2013, as leis foram estendidas aos trabalhadores domésticos. “Ainda não é a igualdade plena, mas veio em benefício de 7 milhões de trabalhadores domésticos. O Brasil é o maior empregador de domésticas do mundo. A emenda veio corrigir a injustiça”, comemorou.
De acordo com o secretário nacional da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Antonio Lisboa Manso do Vale, que também participou da conferência, 95% desses trabalhadores são mulheres e, na maioria, negras. “Especialmente agora, com a aprovação da PEC das domésticas no Brasil, fica assegurado o mínimo de garantia para essas trabalhadoras”, disse.
Na avaliação da ministra, com essa emenda, o Brasil caminha para a igualdade entre os trabalhadores domésticos urbanos e rurais. “O trabalho digno é um direito fundamental”, afirmou.
Na ocasião, o desembargador e representante da Nova Associação dos Juízes da Alemanha, Martin Wenning Monghentaler, fez uma exposição dobre o Direito do Trabalho na Alemanha que, há cerca de 100 anos, é considerado uma área autônoma do Direito naquele país. “Os conflitos nas relações de trabalho são muito grandes. Na constituição alemã os interesses contratuais são regulados para o trabalhador, e outro ponto para os empresários. O direito alemão destina-se a equacionar as diferenças muito grandes entre os dois lados”. Ele também ponderou que o direito trabalhista, no nível internacional, tenta impedir excessos e disse que, atualmente, a flexsecurity (segurança flexível) é praticada na Comunidade Europeia.
Em mais uma exposição, o presidente da Comissão Especial de Direito Sindical do Conselho Federal da OAB, Bruno Reis de Figueiredo, abordou a questão dos advogados sindicais. Bruno Figueiredo chamou atenção para o fato de que o Direito Sindical não é ensinado nas faculdades de Direito do Brasil, o que, em sua opinião, “fragiliza” a modalidade. Na avaliação do presidente da Comissão Especial de Direito Sindical do Conselho Federal da OAB, os advogados muitas vezes estão despreparados para tratar de temas dessa área. Ele destacou também que as ações coletivas perderam força no Brasil.
Na conclusão do painel, o ex-presidente da OAB Piauí, Sigifroi Moreno Filho, ressaltou que a Justiça do trabalho “se transformou em uma Justiça bastante ampliada por causa do alargamento da competência de Justiça do Trabalho”. O ex-presidente da OAB do Piauí propôs a adoção de um código de processo de trabalho para abarcar o que há de mais moderno, universalizando os procedimentos legais, e sugeriu que a Ordem dos Advogados do Brasil apresentasse um multiprojeto sobre o tema e o levasse ao Supremo Tribunal do Trabalho.
O painel teve como secretário o conselheiro federal da OAB, José Danilo Correia Mota, e como relator o secretário geral da OAB/RJ, Marcus Vinicius Cordeiro.