A viúva e dois filhos de um trabalhador da Cooperativa Agropecuária Alto Uruguai (Cotrimaio) devem receber, cada um, R$ 100 mil de indenização por danos morais, além de pensão mensal equivalente a dois terços do salário recebido pelo empregado, que morreu soterrado por várias toneladas de grãos de soja enquanto realizava atividade em um dos silos da Cooperativa. A condenação foi imposta pela 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) e reforma sentença do juiz Valtair Noschang, da 1ª Vara do Trabalho de Santa Rosa. Na data do acidente, partes do silo estavam interditadas por ordem da auditoria do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), situação que impediria a presença de trabalhadores no local. Também estava em vigor Termo de Ajuste de Conduta firmado com o Ministério Público do Trabalho (MPT), no qual a Cotrimaio se comprometeu a realizar adequações quanto às condições de saúde e segurança dos seus empregados. Tais adequações, conforme os autos, ainda não haviam sido realizadas no dia da morte do empregado. Para os desembargadores da 2ª Turma do TRT4, houve "descumprimento manifesto das normas de segurança no trabalho".
De acordo com informações do processo, o empregado foi contratado como safrista em março de 2010 e o acidente que ocasionou sua morte ocorreu em 27 de abril daquele ano, por volta de 21h, enquanto realizava a movimentação de grãos de soja em um dos armazéns da Cooperativa. O trabalhador contava com 37 anos e foi encontrado no dia seguinte, soterrado pela carga de soja. Diante deste fato, sua esposa, também de 37 anos, e seus dois filhos menores (12 e 5 anos) ajuizaram ação na Justiça do Trabalho pleiteando indenizações por danos morais e materiais. Para provar suas alegações, anexaram aos autos, entre outros documentos, laudo pericial da Secretaria da Segurança Pública do estado e relatório da fiscalização do Trabalho.
Conforme o laudo, não havia nenhum sistema que impedisse a aproximação indevida do silo, e o trabalhador, provavelmente, não estava acompanhado por um colega e não usava cinto de segurança e cabo de vida, medidas previstas pela Norma Regulamentadora 31 do MTE. Já o relatório da auditoria do Trabalho concluiu ser rotina na Cooperativa a entrada de trabalhadores em locais confinados sem adoção dos procedimentos previstos nas normas de segurança, além de não haver ordem de serviço capaz de dar ciência ao safrista sobre os riscos da atividade e prevenção de acidentes.
Entretanto, ao julgar o caso em primeira instância, o juiz de Santa Rosa concluiu pela culpa exclusiva do trabalhador no acidente. O magistrado argumentou, na sentença, que o local do acidente, segundo os laudos, apresentava placas de advertência sobre a necessidade de uso de equipamentos de proteção individual e cabo de vida para evitar quedas, além da presença de um observador. "Assim, segundo os depoimentos das testemunhas convidadas pela reclamada, a vítima não recebeu treinamento para escalar o monte de soja, justamente porque as orientações lhe proibiam de fazê-lo. Ou seja, a vítima não tinha autorização para escalar o monte", destacou o julgador. "Considerando todos os elementos de prova existentes nos autos, não chego a outra conclusão senão a de que a vítima escalou o monte de grãos por sua conta, estando orientado a não fazê-lo. Assim, assumiu o risco", concluiu, indeferindo os pedidos de indenização. Os reclamantes, insatisfeitos com a sentença, recorreram ao TRT4.
Alegações procedentes
Ao relatar o caso na 2ª Turma, a desembargadora Vania Mattos destacou não haver nos autos nenhuma prova de que o trabalhador teria escalado o monte de soja sem autorização ou permissão. Segundo a magistrada, o conjunto probatório demonstra a "extrema negligência da ré com a segurança dos empregados". A desembargadora salientou a vigência do termo de interdição do MTE e o depoimento oferecido por um colega do trabalhador morto, afirmando que naquele mesmo dia ele teria entrado no depósito de soja, cujo túnel estava interditado. A julgadora ressaltou, também, que adequações determinadas pelo MTE no momento da interdição e constantes de Termo de Ajuste de Conduta firmado com o MPT em 2009 ainda não haviam sido implementadas, além da existência de notícia sobre a morte de outro trabalhador nas dependências da Cooperativa.
Para a relatora, "Não há como ser configurada a tese de culpa exclusiva da vítima, que pressupõe a conduta desta como causa única e autônoma do acidente, sem relação com o descumprimento de normas de segurança e de fiscalização impostas à empregadora". "Há fundamento para caracterização de culpa grave e exclusiva da ré pelo evento, na medida em que evidenciado o dano causado, além do inequívoco nexo de causalidade deste com o trabalho", concluiu.
Processo 0001317-29.2010.5.04.0751 (RO)