28 de Fevereiro – Dia Mundial de Combate às LER/DORT

A Organização Mundial da Saúde (OMS) instituiu o Dia Internacional de Prevenção às LER/DORT, celebrado anualmente em 28 de fevereiro, visando alertar aos trabalhadores, empregadores e as autoridades a respeito da necessidade de adotar cuidados e medidas preventivas contra lesões associadas à repetição de movimentos. 

A sigla LER – Lesão por Esforço Repetitivo compreende um conjunto de doenças causadas pela realização de atividades contínuas e repetitivas. DORT – Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho são  doenças causadas por movimentos repetitivos durante o desempenho do labor. Ambos os problemas levam a lesões nas estruturas dos tendões, músculos e ligamentos, que são consequências do esforço físico em excesso, má postura, estresse e condições desfavoráveis de trabalho.

A LER e DORT são doenças reconhecidas por meio de ocorrência de vários sintomas, de aparecimento quase sempre em estágio avançado, com lesões geralmente nos membros superiores, acarretando dor, sensação de peso e fadiga. Algumas dessas acometem os trabalhadores com lesões no ombro e as inflamações em articulações e nos tecidos que cobrem os tendões. Em muitas situações ocorrem degeneração de tecidos, atingindo inclusive os membros superiores, região escapular e pescoço.

Na grande maioria das vezes, essas doenças estão relacionadas ao trabalho e afetam diretamente a qualidade de vida da pessoa, além de prejudicar a sua produtividade laboral e o seu comprometimento profissional e financeiro. E, geralmente, são responsáveis pela maior parte dos afastamentos ao trabalho e representam custos com pagamentos de indenizações, tratamentos e processos de reintegração à ocupação.

Entre esses distúrbios, o diagnóstico da LER1 é essencialmente clínico e baseia-se na história clínico-ocupacional, no exame físico detalhado, nos exames complementares quando justificados e na análise das condições de trabalho responsáveis pelo aparecimento da lesão.

No primeiro estágio, o trabalhador tem uma sensação de peso e desconforto no membro afetado, com dor espontânea localizada nos membros superiores ou cintura escapular, às vezes com pontadas que aparecem em caráter ocasional, durante a jornada de trabalho, e não interferem na produtividade. A dor pode se manifestar durante o exame clínico, quando comprimida a massa muscular envolvida.

No segundo estágio, a dor é mais persistente e mais intensa e aparece durante a jornada de trabalho de modo intermitente. É tolerável e permite o desempenho da atividade profissional, mas já com reconhecida redução da produtividade nos períodos de maiores esforços. 

Nessa segunda fase, a dor torna-se mais localizada e pode estar acompanhada de sensação de formigamento e calor, além de leves distúrbios de sensibilidade; mesmo com o repouso, a dor pode aparecer ocasionalmente quando fora do trabalho, durante as atividades domésticas. Pode ser observada uma pequena nodulação acompanhando a bainha dos músculos envolvidos.

Na terceira fase da doença, a dor torna-se mais persistente, é mais forte, tem irradiação mais definida. O repouso em geral só atenua a intensidade da dor, nem sempre a fazendo desaparecer por completo, persistindo mesmo fora do trabalho. É frequente a perda da força muscular. Nesse período há sensível redução da produtividade, quando não há impossibilidade de executar a função. Os trabalhos domésticos são limitados ao mínimo e muitas vezes não são executados. Os sinais clínicos estão presentes. O edema é frequente e recorrente, as alterações da sensibilidade estão quase sempre presentes, especialmente nos paroxismos dolorosos e acompanhados por manifestações vagas, como palidez e hiperemia e sudorese da mão.

No último estágio da LER – Grau IV – está presente a dor forte, contínua e muitas vezes insuportável, levando o trabalhador a intenso sofrimento. Os movimentos aumentam a dor que, em geral, se estende em todo membro afetado. A perda de força e a perda do controle dos movimentos se fazem constantes. O edema é persistente e, nesse caso, aparecem deformidades, provavelmente por processos fibróticos, reduzindo a circulação linfática de retorno. As atrofias, sobretudo dos dedos, são comuns e atribuídas ao desuso.

Nas fases mais avançadas, a capacidade de trabalho é anulada e a invalidez se caracteriza pela impossibilidade de um trabalho produtivo regular. Os atos da vida diária são também altamente prejudicados. Nesse estágio são comuns às alterações psicológicas e a experiência evidencia que, a maioria dos trabalhadores portadores de LER desconhece a origem da doença.

Algumas empresas e serviços de saúde ocupacional desenvolvem atividades coletivas, paralelas ao tratamento, com Grupos de Portadores de LER2 e têm obtido bons resultados, permitindo a socialização da vivência da doença e da incapacidade de vida social, a peregrinação para o diagnóstico e tratamento, os temores e dúvidas sobre o futuro. Além da repercussão favorável no tratamento, essa atividade coletiva ajuda a preparar o paciente para seu retorno ao trabalho.

É importante destacar a existência do vínculo de causa-efeito entre a doença adquirida no exercício do labor e as condições desfavoráveis do trabalho.

Efetivamente, as condições específicas de trabalho (gestos, posições, movimentos, esforços, tensões, ritmo, carga de trabalho, etc.) podem afirmar ou excluir o vínculo de causalidade da lesão com o trabalho. Nesse sentido, nenhum exame laboratorial subsidiário pode concorrer para a elucidação dessa relação de causalidade com o trabalho.

A CLT- Consolidação das Leis do Trabalho, em seu capítulo V, estabelece normas de Segurança e Medicina do Trabalho que determinam regras específicas, inclusive a criação de Normas Regulamentadoras (NRs) que tratam de algumas atividades ou situações peculiares. As NRs estabelecem obrigações, direitos e deveres a serem cumpridos por empregadores e trabalhadores com o objetivo de garantir trabalho seguro e sadio, prevenindo a ocorrência de doenças e acidentes de trabalho.

As primeiras Normas Regulamentadoras foram publicadas por meio da Portaria nº 3214/1978 do Ministério do Trabalho, e ao longo do tempo, outras NRs foram criadas com o objetivo de assegurar a prevenção da segurança e saúde de trabalhadores em atividades laborais e segmentos econômicos específicos.

No caso da NR – 17 criada pela Portaria MTb n.º 3.214, de 08 de junho de 1978, com alterações posteriores, trata de ERGONOMIA, ou seja, estabelece regras e condições de trabalho visando atividades relacionadas ao levantamento, ao transporte e descarga de materiais, ao mobiliário, aos equipamentos e às condições ambientais do posto de trabalho, além da própria organização do trabalho, sempre visando à saúde física e mental dos trabalhadores. 

Infelizmente as normas previstas na CLT não são suficientes para reduzir a LER/DORT. Num levantamento do Ministério da Saúde publicado em abril de 2019 mostra que, em 10 anos, as duas doenças representam 67.599 casos entre os trabalhadores do país. Esse índice aumentou 184% no mesmo período.

A constatação é do estudo Saúde Brasil 2018, do Ministério da Saúde. Utilizando dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN), o levantamento aponta que, entre os anos de 2007 e 2016, 67.599 casos de LER/DORT foram registrados.  Neste período, o total de notificações cresceu 184%, passando de 3.212 casos, em 2007, para 9.122 em 2016.

Os dados, que constam no ‘Panorama de Doenças Crônicas Relacionadas ao Trabalho no Brasil’, indicam aumento na exposição de trabalhadores a fatores de risco, que podem ocasionar incapacidade funcional. O estudo apontou, também, que esses problemas foram mais recorrentes em trabalhadores do gênero feminino (51,7%), entre 40 e 49 anos (33,6%), e em indivíduos com ensino médio completo (32,7%). A região que registrou o maior número de casos foi o Sudeste, com 58,4% do total de notificações do país no período. Em 2016, os estados que apresentaram os maiores coeficientes de incidência foram Mato Grosso do Sul, São Paulo e Amazonas.

Desde março de 2020, o Brasil enfrenta a pandemia provocada pelo novo coronavírus, alterando sobremaneira a forma de execução das atividades laborais.                      

Em razão da necessidade do distanciamento social por conta da COVID-19, o home office, uma forma de teletrabalho, passou a ser realizado de forma geral e permanente, para prestação de serviços e execução das atividades profissionais.

Muitas vezes o ambiente residencial tem sido inadequado à realização de tarefas como, por exemplo, a digitação por várias horas em cadeira inadequada. Assim, as condições adversas para realização do trabalho, cumulada como esgotamento mental em decorrência isolamento social, desemprego e da crise econômica que o país se encontra, aumentaram as doenças físicas e mentais e, com certeza, aumentarão a incidências da LER/DORT.

É necessária uma conscientização dos empregadores, trabalhadores e gestores públicos para criar condições de ambiência laboral sadia, com redução de doenças como a LER/DORT intimamente relacionada com a organização do trabalho.

São notórios os prejuízos causados pelas doenças como a LER/DORT, um enorme problema para a saúde pública, visto que o Estado passa a gastar valores enormes em indenizações, além do alto custo do tratamento médico. É um problema para o empregador, que na maioria das vezes é condenado a pagar indenizações e tratamentos médicos ao trabalhador ou trabalhadora. E é um problema muito maior para as pessoas que adoecem, que além de adquirir a incapacidade para o trabalho e para suas atividades pessoais, ainda sofrem com a redução de sua remuneração. Certamente estas pessoas estão ou ainda serão acometidas por adoecimento físico e mental.

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Referências:

1- Ministério do Trabalho. LER – Normas Técnicas para Avaliação de Incapacidade. Brasília. Ed.1991, pág.13.

2- Organização Pan-Americana da Saúde/Brasil – DOENÇAS RELACIONADAS AO TRABALHO – MANUAL DE PROCEDIMENTOS PARA OS SERVIÇOS DA SAÚDE. BRASÍLIA/DF -2001.

https://www.paho.org/pt/search/r?keys=DOEN%C3%87AS+RELACIONADAS+AO+TRABALHO+LER%2FDORT

3- Estudo publicado em 30/04/2019. https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/noticias/ler-e-dort-sao-as-doencas-que-mais-acometem-os-trabalhadores-aponta-estudo.  

4- Idem item anterior.

5- https://www.anamt.org.br/portal/2019/04/30/ler-e-dort-sao-as-doencas-que-mais-acometem-os-trabalhadores-aponta-estudo/

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Maria José Giannella Cataldi Advogada, professora, mestre e doutora em Direito do Trabalho pela PUC-SP. Autora do livro “O Stress no Meio Ambiente de Trabalho”, 4ª. Ed.-Revista dos Tribunais.