O GDF deverá pagar R$ 10 milhões, o SLU pagará R$ 5 milhões, a Valor Ambiental, R$ 3,5 milhões e a Quebec Construções, R$ 1 milhão. A decisão foi da juíza do Trabalho Naiana Carapeba Nery de Oliveira, coordenadora da Coordenadoria de Apoio ao Juízo Conciliatório e Execuções Especiais (CDJUC), unidade responsável por analisar e julgar a Ação Civil Pública (ACP) ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho do DF (MPT-DF). Segundo a magistrada, as indenizações serão revertidas a favor de instituições não-governamentais sem fins lucrativos a serem indicadas pelo MPT-DF, que deverão ser localizadas no DF e destinadas à qualificação de trabalhadores e também direcionadas ao cuidado a infância e da juventude.
Em sua decisão, a juíza Naiana Carapeba pontua que nenhum dos envolvidos – GDF, SLU e empresas de serviços ambientais – atuou com eficiência e/ou sintonia, que todos falharam na tarefa de erradicar a presença de menores do local. “As tentativas de retirada das ocupações ilegais da Invasão da Estrutural (que após passou a ser denominada Vila Estrutural) não tiveram êxito e também estão fartamente documentadas nos autos. (…) Tal fato, porém, não permite concluir que ao se tolerar que a população estabelecesse residência nos arredores do Aterro da Estrutural/Lixão da Estrutural, também seria tolerada a presença de menores nas áreas destinadas ao descarte de dejetos, como se verificou”, sustentou a magistrada.
De acordo com juíza, os diversos documentos apresentados pelo MPT-DF, as vistorias e inspeções judiciais realizadas no Lixão demonstraram que os menores e suas famílias vivenciavam situação esdrúxula na qual revindicaram para si o “direito” de adentrarem sem qualquer limitação na área do aterro, escondendo-se sob a falácia de que não se submetiam, por menores de idade, ao poder de nenhum deles, restando expostos a riscos de toda ordem: físicos, morais, psicológicos. “O resultado foi cruel, embora previsível: adoecimento físico e moral, morte e degradação”, apontou na sentença.
Responsabilidade
Conforme a magistrada, o que se constatou foi que tal atitude contou com absoluta leniência de todos os envolvidos e a inércia dos mesmos atraiu a sua responsabilidade, ainda que em diferentes graus. “Tal situação de tolerância era de absoluto conhecimento do Distrito Federal, do Serviço de Limpeza Urbana e das empresas rés que operam no aterro. E que todas elas se agasalharam, esconderam-se atrás de meros paliativos, do jogo de ‘empurra-empurra’, do declarar falta de estrutura física e de pessoal, do clamar pela responsabilidade do ‘outro’ (…), enquanto a infância e a juventude viveu a violação diuturna de todas as garantias mínimas que lhes foram endereçadas desde a Carta Constitucional, desde a subscrição de recomendações da OIT, da edição do Estatuto da Criança e do Adolescente e de incontáveis outros instrumentos normativos que permaneceram como meras promessas vazias e irrealizadas”, observou.
Ausência de recursos
O GDF e a SLU, no entendimento da magistrada, não comprovaram de forma objetiva a inexistência de recursos públicos para solucionar o problema. “Há que se observar que, mesmo quando se está diante da escassez de recursos públicos não se pode olvidar da responsabilidade absoluta do Estado quando se trata de garantir o mínimo de dignidade às suas crianças. Retirar crianças do trabalho e do estar no maior depósito de lixo a céu aberto da América Latina compreende-se na interpretação razoável do direito mínimo de dignidade garantido às pessoas pela Constituição Federal. E da concretização de tal direito não se isenta o Estado, sob nenhuma argumentação. Inexiste, friso, discricionariedade administrativa entre permitir ou não o trabalho infantil, tanto mais o trabalho infantil insalubre e perigoso”, ressaltou a juíza.
Perda de parte do objeto
Na Ação Civil Pública, o Ministério Público do Trabalho pedia, além da condenação por danos morais coletivos, providências e melhorias na estrutura física do Lixão da Estrutural para viabilizar a vigilância e o controle de acesso dos catadores, evitando, assim, a entrada de crianças e adolescentes na área. Pedia, também, que os menores das famílias dos catadores de lixo que ali atuavam fossem resgatados, por meio da implementação de políticas públicas específicas (acesso a programas sócio-educativos). Contudo, no final de janeiro deste ano, o Aterro da Estrutural foi desativado. Assim, a questão jurídica posta para apreciação pela Justiça do Trabalho também foi encerrada, embora “o problema social referente às famílias de baixa renda residentes na Vila Estrutural ainda exista”, constatou a magistrada.
Segundo maior lixão do mundo
O Lixão da Estrutural funcionou até o início deste ano como depósito de lixo a céu aberto, ocupando atualmente uma área de mais de 200 hectares – equivalente a 280 campos de futebol, contendo mais de 40 milhões de toneladas de resíduos na data do encerramento das suas atividades. O local recebia quase todo o lixo produzido pelos moradores do Distrito Federal, sem qualquer tratamento ou triagem. O aterro se tornou o maior lixão da América Latina e o segundo maior do mundo, perdendo apenas para o lixão de Jacarta, na Índia. Seu entorno, em pouco tempo, passou a ser habitado por pessoas em busca de meios de sobrevivência. Famílias inteiras passaram a trabalhar na catação de lixo, submetidas a riscos de saúde e de segurança. No lixão, também era comum a prática de crimes, como o tráfico de drogas e a prostituição.
Fonte: TRT10