A empregada foi violentamente agredida por uma colega de trabalho e pela mãe desta, quando, no cumprimento dos seus deveres profissionais, comunicou-lhe que estava sendo dispensada do emprego.
A trabalhadora não se conformava com a sentença que indeferiu o pedido de responsabilização da empregadora pelo ato de violência que a vitimou. E teve suas razões acolhidas pelo relator, com base no artigo 932, inciso III, do Código Civil. Conforme explicou o julgador, a regra prevê a responsabilidade civil do empregador por atos praticados por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele. Consagra, portanto, a responsabilidade por ato de terceiro, atribuindo o dever de reparação à pessoa diversa do autor material do dano. Nesse quadro, nas palavras do relator: considera-se responsável pessoa que, apesar de não ter contribuído diretamente para a existência do dano, guarda algum vínculo jurídico com o autor do ato ilícito, em relação ao qual tem um dever de guarda, vigilância ou custódia.
Para ele, essa é exatamente a situação retratada na ação. Isso porque, conforme ficou demonstrado, no desempenho de suas funções na empresa, ao comunicar a uma empregada que ela estava sendo dispensada, a reclamante foi brutalmente agredida pela trabalhadora dispensada e pela mãe desta, que também era empregada da ré, fatos confirmados por Boletim de Ocorrência e pela prova testemunhal. Pelas declarações de uma testemunha, ficou evidente a brutalidade e a gravidade da violência sofrida pela reclamante.
A testemunha ocular da cena, que também trabalhava na empresa na época, descreveu todo o ocorrido com riqueza de detalhes. Ela estava na recepção da empresa e viu, quando a reclamante, dentro de sua sala, com a porta aberta, chamou a empregada para dispensá-la. Em determinado momento, a reclamante a chamou para entrar na sala a fim de testemunhar o fato de a empregada se recusar a assinar a comunicação da dispensa (aviso prévio). Foi quando presenciou a empregada rasgar o documento e o jogar na reclamante, xingando-a com palavras de baixo calão. A seguir, a empregada atacou a reclamante, agarrando-a pelos cabelos e batendo a sua cabeça em uma cadeira, o que provocou lesão e sangramento. Quando a reclamante já estava deitada no chão de barriga para cima, a agressora prendeu os braços dela.
Logo em seguida, a mãe da agressora, que a acompanhava e que também era empregada da empresa, entrou na sala e passou a agredir a reclamante, dando-lhe socos, junto com a filha. Nesse momento, gritou a Sra. Érica, coordenadora da reclamada, que foi até a sala da reclamante. Ambas (coordenadora e testemunha) tentaram interromper as agressões da empregada e da mãe à reclamante, mas não conseguiram. Então, subiu um andar e pediu a um coordenador que descesse para ajudar, mas ele se omitiu. Conseguiu então a ajuda de um promotor de vendas, que acabou interrompendo as agressões. A agressora foi embora e a reclamante chamou a polícia para fazer um B.O., mas não pode esperar porque sangrava muito na cabeça..
Diante da gravidade da agressão sofrida pela reclamante, dentro do estabelecimento da ré e no horário de expediente, o relator não teve dúvidas de que a empresa deve reparar os danos causados a ela. Como fundamento da decisão, ele citou o inciso XXI do artigo 7º da Constituição da República que prevê, como direito do trabalhador, a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança. Referiu-se, também, ao artigo 2º da CLT, segundo o qual a figura do empregador tem, em sua definição, a assunção dos riscos da atividade econômica, cabendo-lhe dirigir a prestação pessoal de serviços e, desse modo, zelar pela segurança, pela saúde e pela integridade física e mental de seus empregados, deveres que, conforme frisou o desembargador, não foram cumpridos pela ré. Nesse contexto, para o relator, a empresa tem responsabilidade pela reparação dos danos suportados pela reclamante, nos termos do artigo 927 do Código Civil.
No voto, ele ponderou que, tratando-se de responsabilidade civil, a regra geral é que cada um responde por seus próprios atos ou exclusivamente pelo que faz: É o que se denomina responsabilidade direta ou responsabilidade por fato próprio e que tem por base o artigo 186 do Código Civil, segundo o qual comete ato ilícito aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, viola direito e causa dano a outrem, ainda que exclusivamente moral.
Mas, conforme explicou o relator, como exceções ao princípio da pessoalidade, o artigo 932 do Código Civil prevê as hipóteses de responsabilidade indireta ou responsabilidade pelo fato de outrem: Nesses casos, a responsabilidade se desdobra do autor material do dano, alcançando pessoa que não concorreu diretamente para o fato, mas mantém um vínculo jurídico com o sujeito do ato ilícito (dever de guarda, vigilância ou custódia), exatamente como ocorre com a empregadora em relação ao empregado. O julgador ainda lembrou que, de acordo com os artigos 932, inciso III, e 933, ambos do Código Civil, o empregador responde pelos atos praticados por seus empregados, serviçais ou prepostos, mesmo que não tenha tido culpa na sua ocorrência: O dispositivo consagrou a tese da responsabilidade objetiva em relação ao responsável indireto.
Ou seja, uma vez comprovada a culpa do empregado ou preposto, autor material do dano, o empregador responde objetivamente, já que tem o dever objetivo de vigilância quanto aos atos de seu empregado. Essa é exatamente a situação retratada, registrou. De acordo com o relator, a responsabilidade por ato de outra pessoa se constitui pela infração do dever de vigilância: Não se trata, em outras palavras, de responsabilidade por fato alheio, mas por fato próprio decorrente da violação do dever de vigilância. Por isso, alguns autores preferem falar em responsabilidade por infração dos deveres de vigilância, em lugar de responsabilidade pelo fato de outrem, ressaltou. Para completar, ele lembrou que a responsabilidade objetiva do empregador também se explica pela teoria do risco-proveito ou pela teoria do risco da empresa, que determina que cabe ao empregador responder pelo risco do empreendimento e pelos atos de seus empregados, que, afinal, constituem uma verdadeira extensão da mão do patrão no exercício das múltiplas funções empresariais.
Por tudo isso, no entendimento do relator, assim como da Turma revisora, que acompanhou o seu voto, a ré, na qualidade de empregadora da pessoa que agrediu a reclamante, deve responder pelos danos provenientes do ato violento. Danos morais Conforme observou o relator, cujo entendimento foi acolhido pela Turma, o dano moral, no caso, está implícito na própria ofensa, ou seja, decorre da gravidade do ilícito em si: Se a ofensa é grave e de repercussão, por si só justifica a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado, frisou. Dessa forma, embora a prova técnica realizada no processo tenha atestado que os distúrbios psíquicos da reclamante não têm causa ou concausa com o trabalho, na visão do desembargador, ao ser vítima da violenta agressão praticada pela colega de trabalho, a reclamante foi atingida não só em sua integridade física, mas também em sua honra e em sua dignidade, o que gera o direito à reparação dos danos morais, fixada em R$10.000, conforme parâmetros já adotados pela Turma em casos anteriores.
Danos materiais – Lucros cessantes Segundo o relator, os danos materiais subdividem-se em danos emergentes (despesas médicas) e lucros cessantes. Em relação aos danos emergentes, ou seja, as despesas médicas, foram consideradas indenizáveis apenas aquelas comprovadas no processo, que no caso, somam R$2.370,00, sendo a empresa condenada a restituir esse valor à empregada. Relativamente aos lucros cessantes, de acordo com o relator, estes englobariam, a princípio, a remuneração mensal da reclamante, correspondente ao período de afastamento previdenciário por auxílio-doença, já que, nesse período, ela permaneceu incapacitada. No entanto, tendo em vista os limites do pedido, a Turma deferiu à reclamante apenas as diferenças entre o salário e o benefício previdenciário. Rescisão Indireta Além das indenizações por danos morais e materiais, a reclamante ainda requereu o reconhecimento da rescisão indireta ante a agressão física sofrida, o que também foi acolhido pela Turma.
Ficou entendido que a agressão física sofrida pela reclamante por parte da colega de trabalho, no horário de expediente, é suficiente para a configuração da falta grave do empregador, de forma a tornar insustentável a manutenção do vínculo de emprego, conforme previsto no art. 483, f, da CLT. Assim, tendo sido reconhecida a rescisão indireta do contrato de trabalho, a empresa ainda foi condenada a pagar à reclamante as verbas trabalhistas decorrentes (aviso prévio, 13º salário proporcional, férias proporcionais + 1/3 e FGTS mais 40%), juntamente com a entrega do TRCT e das guias do seguro desemprego.
Fonte: TRT3