O importante impacto 25 anos depois da promulgação da Constituição Federal de 1988 e do Estado Democrático de Direito na interpretação das leis, tomada de decisões e organização das políticas públicas foi a tônica do painel “A Constituição Federal 25 anos depois”, conduzido pelo presidente da Coordenação de Organização da Comemoração dos 25 anos da Constituição brasileira, Ruy Samuel Espíndola. Dele participaram como palestrantes o advogado integrante da Comissão Nacional de Estudos Constitucionais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Luciano de Araujo Ferraz; o ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal, Carlos Mario da Silva Velloso; e o vice-presidente da Assembleia Legislativa de São Paulo e procurador de Justiça licenciado Fernando Capez.
Luciano Ferraz abordou o tema “Os Direitos Fundamentais como Política de Estado”. Na palestra, afirmou que, para que os princípios insculpidos na Constituição sejam minimamente efetivados, uma vez que não há como garantir para todos a integralidade do que está previsto na Carta Magna, são necessárias políticas públicas sociais, na área econômica, culturais e na área social.
Para tornar as políticas públicas eficazes, sustentou Ferraz, é preciso que haja um juízo de ponderação, que são escolhas políticas tomadas pelos órgãos competentes formuladas com base em dois grandes princípios: o da universalização (segundo o qual as políticas públicas devem conseguir captar a maior gama possível de destinatários) e o da isonomia (tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais).
“Quem formula tais políticas são os poderes Legislativo e Executivo, visto que as políticas públicas devem estar consubstanciadas em atos normativos. O Judiciário contrasta a política com a Constituição, mas não a formula”, ensinou o integrante da Comissão de Estudos Constitucionais da OAB. “É preciso ver os direitos fundamentais também numa perspectiva objetiva, sob o ponto de vista da comunidade. Temos fins a serem perseguidos e, para a concretização desses direitos fundamentais, o caminho está na Constituição Federal”, acrescentou.
Leis justas
Ao abordar o tema “Interpretação e Aplicação das Normas Ordinárias de Processo em Conformidade com as Normas Fundamentais de Garantia Processual”, o ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal, Carlos Mario da Silva Velloso, afirmou que as regras maiores do Direito processual advêm da Constituição e dos princípios lá insculpidos, formando a base de todo o direito processual brasileiro.
Para o ministro, as leis devem ser elaboradas com justiça e racionalidade, sob a ótica de que a ação estatal não produzirá lesões aos interesses privados. “As leis devem ser justas, razoáveis e guardar substancial nexo com o objetivo que se quer atingir. O Estado Democrático de Direito tem como meta assegurar os direitos coletivos, sociais individuais, os políticos e os interesses difusos e coletivos. No entanto, a liberdade individual constitui a base de tudo isso. Na medida em que esses direitos sejam garantidos, a sociedade democrática terá realizado sua meta fundamental”, ensinou.
Ainda segundo Carlos Mario da Silva Velloso, os direitos de que dispomos hoje não chegaram a nós de graça e, por essa razão, devem os advogados prosseguir com a missão de proteger as garantias da sociedade. “Devemos seguir aplicando os princípios constitucionais, acreditando que a Constituição é o escudo maior de proteção dos indivíduos. É importante não esmorecer e o fato de estarmos aqui, a celebrar os 25 anos da Carta Magna, constituem a certeza de que não esmoreceremos jamais”, acrescentou o ministro.
Mudança interpretativa
A abordagem do tema “Direito Penal no Século XXI” coube a Fernando Capez. Ele iniciou sua fala destacando como a parte mais importante do texto constitucional o caput do artigo 1º da Carta, que afirma que a República Federativa do Brasil constitui-se em um Estado democrático de Direito. Segundo Capez, esta é a pedra de sustentação de todo o arcabouço jurídico brasileiro e, desde sua implementação, mudou dramaticamente todo o conteúdo e interpretação dos artigos da Constituição Federal.
Em sua exposição, Capez apresentou de que forma a lei penal vem sendo aplicada no país desde os tempos primórdios da civilização, quando o direito penal era aplicado pelo pajé da tribo, até passar pela Idade Média, Revolução Francesa e culminar no século XIX, quando se cristalizou o que chamou de Estado formal de Direito. Neste momento, explicou Capez, a preocupação era com a segurança jurídica. “Havia um estado formal de direito, em que se buscava a igualdade no plano meramente formal. Todos eram iguais porque a lei era igual para todos, mas o juiz era um mero escravo da lei, sem preocupação com busca de seu conteúdo”, afirmou o palestrante, destacando que o Estado formal de Direito para a solução dos conflitos logo mostrou-se insuficiente.
Com a virada para o século XX e adoção do Estado Democrático de Direito a partir da Constituição de 1988, o Direito foi especialmente impactado, comparou Fernando Capez. A partir desse momento, segundo ele, os princípios da Carta Magna passaram a dar nova concretude ao Direito Penal, visto que do Estado democrático de Direito e do princípio da dignidade humana deriva uma série de outros princípios que tem sido aplicado reiteradamente pelo STF, tais como o da insignificância ou da bagatela, o da intervenção mínima e o da confiança.
“Direito não é uma ciência hermética, é eminentemente social” finalizou Capez, para quem este seminário só poderia ter sido feito pela OAB. “Mais do que nenhuma outra instituição, esta esteve nas trincheiras do dia-a-dia, no momento mais difícil por que passou a sociedade brasileira. Parabéns à OAB. Só aqui se poderia fazer, com toda a justiça, essa comemoração pelos 25 anos da Constituição”. O presidente nacional da OAB, Marcus Vinicius Furtado, acompanhou o debate e agradeceu a presença dos palestrantes.