Pescador que ficou à deriva após naufrágio será indenizado por empresa proprietária da embarcação

 

Naufrágio

O naufrágio ocorreu em setembro de 2003, com a embarcação de Pesca Chile II. O barco, com oito tripulantes, partiu de Itajaí (SC) para pescar atum em alto mar. Atingido por duas ondas de cerca de dois metros, afundou após seis dias no mar, a cerca de 220 km de Tramandaí (RS), causando a morte de dois tripulantes.

Os sobreviventes ficaram à deriva numa pequena balsa inflável durante quatro dias, período no qual, segundo o trabalhador, passou fome e sede. Conforme seu relato, mesmo diante de circunstâncias desfavoráveis para navegação, devido à iminência de uma brusca mudança nas condições climáticas, o mestre da embarcação manteve o ritmo normal de trabalho. Ainda segundo ele, o barco tinha sérios problemas de escoamento, o mestre da embarcação não sabia operar o equipamento indicador de posição de emergência, e a balsa salva-vidas tinha instruções escritas em chinês.

A empresa alegou que no dia do acidente, não havia qualquer previsão de mau tempo ou de mar agitado, e que as mudanças ocorridas no dia do naufrágio não chegaram a preocupar a tripulação. Argumentou ainda que a conclusão da Capitania dos Portas foi a de que não houve culpa de sua parte.

“Fortuna do mar”

O juízo da 4ª Vara do Trabalho de Santos (SP) isentou a empresa de responsabilidade pelo acidente, condenando o pescador a pagar as custas processuais no valor de R$ 2 mil. O TRT-SP manteve a sentença. Mesmo reconhecendo a existência do dano e do nexo causal entre o acidente e o trabalho, afastou a responsabilidade civil da empresa com fundamento na inexistência de culpa.

A decisão regional levou em conta a conclusão do inquérito da Marinha no sentido de que a causa determinante do naufrágio foi a “fortuna do mar”, que corresponderia à força maior prevista no artigo 501 da CLT. Para o Regional, a força do mar, embora previsível, “é inevitável, já que é um fato da natureza”.

TST

O relator do recurso do pescador ao TST, ministro Alexandre Agra Belmonte, ao propor o reconhecimento do dever de indenizar, destacou as “circunstâncias apavorantes” enfrentadas pelos tripulantes, que viram a morte de dois colegas e ficaram à deriva. “Soa no mínimo estranho que uma empresa de pesca não conte com o apoio de uma equipe de resgate para circunstâncias como tais”, afirmou.

Para o relator, a pesca em alto mar é atividade de risco permanente. “Não se tem qualquer garantia de que não surjam situações de grande risco ao longo do trabalho, e, ocorrendo, há séria dificuldade de se escapar em situação semelhante à imposta aos tripulantes do Chile II”, assinalou. A tempestade, segundo ele, não pode ser considerada como situação imprevisível: “pelo contrário, é previsível e contumaz quando no alto mar”.

Por unanimidade, a Turma aplicou ao caso a teoria do risco (artigo 927, parágrafo único, do Código Civil), que, conforme explicou o relator, “dá ênfase à mera relação de causalidade, abstraindo-se tanto da ilicitude do ato quanto da existência de culpa”. Para o colegiado, a responsabilidade objetiva da empresa ficou comprovada, “tanto assim que o acidente não pôde ser evitado”.

Fonte: TST